O meu primeiro caderno de sonhos começou em 2001. Lembro de querer fazer um caderno como o Diário de Frida Khalo, todo ilustrado, e por isso na primeira página fiz um desenho: O Símbolo do Yin/Yang. Sempre gostei dessa imagem, ela me remetia a unidade que existe nas polaridades. Fiz um par de pingentes com esse símbolo para o meu casamento e o pintei em meu oratório. Mas não tinha menor idéia que esse símbolo seria parte visceral do meu caminho atual. Hoje sou praticante de TaiChi e TaoIn (meditação taoista), práticas da medicina chinesa que são representadas pelo Yin/Yang. Não a toa tratava-se de um caderno de sonhos.
Dizem que nosso cérebro é “usado” apenas em 10% de sua capacidade. Não acredito exatamente nessa noção. O que podemos apreender conscientemente da realidade talvez corresponda a esses 10%, mas nosso “cérebro inteligente” sabe muito mais, enxerga muito mais, e funciona inconscientemente em sua total capacidade. Assim acredito.
Pois então que esse primeiro caderno levou 15 anos da primeira a ultima folha. Escrevia um dia, 3 dias seguidos, uma vez por ano, de tempos em tempos. No segundo semestre de 2016 intensifiquei minha escrita e minha pesquisa. Passei a interpretar os sonhos. Senti a enorme resistência, que conhecemos do campo analítico no consultório, ali na minha frente, como um muro alto alto e duro. Mas segui, sem saber onde iria chegar. E fui deixando as imagens me levarem, a intuição falar. Associação livre é a regra básica na Interpretação de Sonhos, ao menos na corrente freudiana e assim segui fielmente. “Tudo e qualquer coisa que lhe vier à cabeça”.
Passei a usar outros recursos além da escrita no caderno, como a gravação em áudio pela manhã ou a anotação de tópicos no meio da noite. E escolhi enfrentar esses desconhecidos. Lia meus registros, ouvia o áudio e começava a associar. Sempre às cegas, assim começa o percurso.
Em 2017 comecei o segundo. Acabou em 5 meses. Realmente me debrucei sobre meus sonhos. Praticamente todo o dia registrei um ou dois, ou ao menos um fragmento de sonho. Ganhei confiança no meu caminho de abraçar esse mistério, mesmo sentindo a resistência sempre presente.
Cheguei, muitas e muitas vezes a insights interessantes, ricos e repletos de sentido. Tão bonito a maneira como sonho é “construído”!! Fiquei e estou em total encantamento pela riqueza das composições. Um dinamismo imagético sem igual que mistura e une tudo o que estamos vivendo formando enredos impossíveis e verdadeiros. Uma aparente loucura chegar assim mais perto do fluxo Insconsciente.
Tantas vezes senti vontade de pedir permissão para adentrar esse campo, porque ali, existe uma profunda inter-relação e conexão entre tudo e todos.
Tantas vezes, depois de ter chegado num dos possíveis sentidos do Sonho, vi acontecer na realidade diurna momentos desse sonho: nomes, enunciações, situações. Pude perceber que o sonho e a vigília não estão separados e nem são diferentes. Seguem o mesmo fluxo..
Mas tantas vezes estamos simplesmente dormindo, de dia e de noite, e não tocamos essa profunda Sincronicidade micro e macro-cósmica. Muitas vezes preferimos acreditar que a Vida é o nosso dia-a-dia, rotineiro, esforçado e casual. Só se forem os 10% da vida. O restante está na nossa abertura para consagrar a experiência.
Praticar o Caderno dos Sonhos é um exercício da vontade, de fé em navegar pelo desconhecido, pelo sem sentido, pelo despropositado para chegar cada vez mais perto do Caminho e da Luz.